"Debate e esclarecimento sobre a aplicação da Medicina Veterinária no auxilio ao judiciário tanto na esfera Civil como Criminal. Opiniões pessoais a respeito de temas polêmicos que envolva direito dos animais e sua aplicação legal. Baseados em casos reais, relacionando crimes contra animais a realidade humana, com responsabilidade e compromisso social."

terça-feira, 26 de maio de 2015

" Chumbinho" aos peixes!

Estava assistindo ao jornal quando essa matéria me chamou a atenção

Principal agrotóxico utilizado de forma irregular como raticida doméstico o Aldicarb (chumbinho), foi banido do mercado brasileiro. No mês de outubro de 2012, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento publicou o cancelamento do registro do Temik 150 que antes possuia comercialização exclusiva pela empresa Bayer Cropsciences. Com isso, estão proibidos no Brasil a produção, a comercialização e o uso de qualquer agrotóxico à base de Aldicarbe. O uso indiscriminado e irregular como raticida, como agente abortivo e em tentativas de homicídio e de   suicídio, acarreta em um grave problema de saúde pública, de amplitude nacional, dada a facilidade que se tem a seu acesso, principalmente nos centros urbanos. Somente no Estado do Rio de Janeiro estima-se 900 a 1500 casos de intoxicação anual por 'chumbinho', com cerca de 100 mortes evitáveis. 

“O chumbinho é um produto ilegal e perigoso para a saúde da população, sendo o uso e comércio deste agrotóxico como raticida doméstico enquadrado como uma atividade ilícita e criminosa”, explica o diretor de Controle e Monitoramento Sanitário da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Agenor Álvares.


  O Aldicarbe (C H N O S) é um inseticida, acaricida e nematicida do grupo químico metilcarbamato de oxima, substância extremamente tóxica do ponto de vista agudo. Com uma DL 50 oral de cerca de 0,9 mg/kg em ratos e 0,4 mg/kg em camundongos, é um dos agrotóxico mais tóxicos  já registrado no país. Agente anticolinesterásicos, tem sua ação pela inibição da enzima acetilcolinesterase (AChE), responsável pela degradação da acetilcolina (neurotransmissor), que com seu acúmulo na fenda sináptica ocasiona severa estimulação colinérgica, promovendo o estímulo excessivo dos receptores nicotínicos e muscarínicos. As principais manifestações clínicas resultantes da intoxicação por Aldicarbe afetam os mais variados órgãos ocasionando miose, náuseas, vômito, dor abdominal, diarreia, dispneia, depressão respiratória, taquicardia, tremores, ou seja, depressão gradual até a morte. Podemos classificar em  três etapas:
  • 1ª etapa – muscarínica:  aumento das secreções e contrações da musculatura lisa;
  • 2ª etapa – nicotínica: tremores musculares seguidos de convulsões;
  • 3ª etapa– sistema nervoso central: depressão e convulsões.

*lacrimejamento abundante, pálpebras mantem-se fechadas, salivação profusa, ruídos respiratórios são facilmente audíveis.
A morte resulta das alterações respiratórias e da bradicardia.

   Na rotina de clínicas e hospitais veterinários, principalmente em pequenos animais, o tipo de maus-tratos mais constatado é a intoxicação exógena, e adivinhem, em estudo realizado no Departamento de Patologia da FMVZ/USP  o Aldicarbe, é o principal agente responsável pelas mortes por intoxicação. Estimativas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apontam que o produto é responsável por quase 60% dos oito mil casos de intoxicação, no Brasil, todos os anos.. É facilmente absorvido pelo trato gastrintestinal, pele, também ocorrendo relatos de intoxicação por via aerógena..

   Alterações post mortem na toxicose por organofosforados ou carbamatos, macro e microscopicamente (histopatológico) são inespecíficas, representada principalmente por congestão em diversos órgãos e por edema pulmonar de intensidades variadas.

(Foto: Esquerda superior: Cérebro canino apresentando congestão de meninges; E. Inferior: Edema pulmonar; Direita superior: presença de esferas negras característica de aldicarb “chumbinho” em conteúdo estomacal; D. inferior congestão pulmonar)



   Muitas vezes a principal evidência está nos achados químicos e toxicológicos. A abordagem da intoxicação se baseia na varredura da cena do crime, atentando aos achados clínicos e forenses sendo a primeira fonte de informação sobre a causa morte do animal. (posicionamento do cadáver, lugar onde se encontra, as modificações e características do ambiente; Presença de iscas, recipientes de praguicidas, moscas mortas ao redor do cadáver, ervas secas; tipo de  isca)
   Na União Européia é proibido o uso de qualquer substância de destruição massiva e desde 1989 é proibido o uso de agentes tóxicos para a caça. Em 1998 o Tribunal Superior de Justiça de Murcia decretou a primeira sentença por crime de intoxicação de uma águia perdigueira com aldicarbe. Não muitas sentenças foram ditadas devido à falta de informações
    É de grande importância o preparo na coleta de informações periciais  reduzindo a perda de informações sobre os crimes e obtendo-se assim documentos legítimos para o cumprimento da lei.
Existem diferentes testes para qualificação e quantificação do agente causador de intoxicação, tais como: Colorimetria, Espectrofotometria, Espectrometria de massa, Imunoensaio, Cromatografia(delgada/gasosa). Vale pesquisar quais testes estão disponíveis em sua localidade.
As amostras coletadas podem ser convencionais como sangue, urina, conteúdo gástrico, fígado ou ainda alternativas com bile, humor vítreo, cabelo/pelos, dente, unha e osso. Ainda existe a Entomotoxicologia que realiza as análises de drogas na fauna cadavérica.
   Com esses cuidados é possível produzir provas consistentes a respeito da causa mortis do animal em questão e os laudos Médico Veterinário úteis para fomentar a investigação na procura de um culpado.

    Infelizmente mesmo com a proibição do comércio e utilização de produtos a base de Aldicarb é possível compra-lo em muitos dos estabelecimentos agropecuários. Hoje, visto sua ineficiência como raticida, a aquisição é vista como mal intencionada. Casos como esse da matéria que despertou a vontade de explanar a respeito são comuns, por sorte não teve um desfecho trágico. Em contra partida, a intoxicação de animais ainda é vista como fato pouco relevante e são raras as vezes que as autoridades são notificadas. É importante o preparo dos profissionais e também da população para que não se negligencie as ocasiões onde esse crime acontece produzindo provas para se buscar a justiça. Ainda, com uma maior fiscalização, que pode ser feita pela população, o produto pode deixar de circular no nosso país. Denuncie para a Vigilância Sanitária de sua cidade e lembre-se compra e venda de Aldicarb É CRIME.

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sábado, 23 de maio de 2015

Renascer

 Mais de um ano depois venho com muita satisfação retomar as postagens. Vinha desaminada após sucessivas tentativas fracassadas de aplicação na Medicina Veterinária Legal, problemas políticos e questões pessoais me levaram a quase acreditar que não seria possível. Com incentivo de amigos vinha buscando paralelamente este sonho e subestimando o blog acabei o deixando de lado. Porém, inesperadamente fui surpreendida. Devido ao post que publiquei comentando sobre o livro "Manual de Polícia Judiciária Ambiental" desenvolvido pelo NEMA da PC/SP, recebi uma ligação inusitada. Dr. Eron Verissimo Gimenes, coordenador do NEMA, me prestigiou lendo a postagem e entrou em contato para atender ao meu pedido do post. Fui tomada por felicidade, além de um grande Delegado, Dr. Eron é um estudioso e entusiasta ambientalista que vem desenvolvendo um trabalho singular na ACADEPOL de SP (saiba mais), onde luta pela implementação da matéria de Meio Ambiente na Academia. Mais que surpresa pelo contato fiquei lisonjeada. Nesta ocasião fui convidada a participar do XXI Simpósio do Meio Ambiente promovido pelo NEMA para membros da PC/SP e estudantes de Direito de universidades convidadas. 
Além do presente de ganhar o livro, fui contemplada com a palestra do Dr. Gilberto Passos de Freitas, ex Desembargador do Tribunal de Justiça de SP ambientalista com um currículo extenso no desenvolvimento legal da proteção ao Meio Ambiente (saiba mais), explanando a respeito de "Crimes Ambientais: aspectos penal e processual". Pude entender muito mais sobre o desenvolver do Direito Ambiental no Brasil, esclareci os gargalos enfrentados historicamente pela causa, e aprendi que a dificuldade é grande mas a motivação é muito maior. 
Sinto que por mais frustrante que vem sendo lidar com uma sociedade que fecha os olhos para a realidade ambiental que vivemos, há esperança de mudança nesses poucos que dedicam a vida para a proteção deste bem comum. A garra e a inquietação vem se tornando quase que um imã, começou com a minha pós-graduação, onde conheci pessoas maravilhosas, engajadas e determinadas a mudar a realidade, e agora se consolidou com essa nova injeção de animo do Dr. Eron. Estamos criando uma teia, me conforta o fato de não estar sozinha e mais, me entusiasmo com as proporções que tende a tomar. Obrigada Dr. Eron, seu contato foi muito importante para voltar a acreditar que podemos fazer a diferença. O senhor faz a diferença! Não vejo a hora de poder estar trabalhando ao lado de vocês, estudarei como nunca! 


















(A esquerda: Entrega do livro e certificado, Raissa Beck e Dr. Eron Verissimo; A direita superior: Dr. Gilberto Passos de Freitas durante sua palestra; A direita inferior: Raissa Beck e Daniel Paterno sonhando com a PC.)

Ainda, demonstrando sua imensa vontade de nos incentivar, Dr. Eron não só me concedeu um livro, como também mais alguns exemplares para sortear aqui no blog. Então FIQUEI ATENTOS QUE EM BREVE SORTEAREI EXEMPLARES DO LIVRO " MANUAL DE POLICIA JUDICIÁRIA AMBIENTAL" DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SÃO PAULO!

Agradeço novamente ao Dr. Eron pela motivação e concluo este post com um proverbio citado pelo Dr. durante o Simpósio, que descreve muito do sentimento que compartilhamos.
"Quando a última árvore tiver caído, quando o último rio tiver secado, quando o último peixe for pescado, vocês vão entender que dinheiro não se come."